domingo, 29 de julho de 2012

Aroma




Corre corre!
Veja só!

A chuva está chegando e com ela vem um turbilhão de sentimentos
Dor, amor, solidão, amizade, e muitos outros.
Sendo sentimentos ou não,
quando a chuva chega, eles se tornam.

Tornam-se pensamento ao olhar pela janela e ter a lembrança nostálgica.
Acho que sempre que olhamos pela chuva na janela nos lembramos de nossos nove anos.

Ao sentir aquele doce aroma de terra molhada
Queremos pular, brincar, cantar...
Mas nada isso é possível
Somos adultos

Em um escritório
O cheiro de terra molhada se mistura intensamente
Aroma de papel e tinta de impressoras, café
A leve música que soava nos ouvidos acompanhando o cair constante da chuva tornou-se gritos
A doçura da criança tornou-se a distante lembrança.
Talvez por isso a cada chuva a esperança volte.

Um dia serei criança, novamente e brincarei com a terra
até que por ela digerido serei.
E serei
parte o sonho de muitas outras pessoas.
Ao ver a chuva, e sentir o doce aroma de terra molhada,
terra que farei parte. 

Aparências




Bonito brilho constante no céu marca nosso mundo feito de aparências.
Ser belo é ser percebido com a grandeza de uma supernova
Ser percebido é deixar nossa marca como humanos ou coisas
- Sei lá?!
Simples aparência que marca o que não somos pelos olhos dos que são.
Simples aparência que nos significa

Marcas deixadas em um espectro de cores e lembranças em preto e branco
Somos nós, marcas vivas de algo muitas vezes já inexistentes
Marca travada de nossa humanidade tardia

Somos nós, estrelas!

Somos a marca de nosso brilho retardado à nossa historicidade

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Maquinarização






Troco facilmente uma noite pelos bares da cidade
por uma noite a escrever
O curto momento onde o Eu está comigo “mesmo” fingindo ser outro
Troco toda efemeridade de noites vazias pela profundidade das palavras
Tortas, calejadas, marcadas de historicidade.

Falar sobre temas já falados como amor, dor, solidão
amizade, ciúme, paixão
Falar sobre a liberdade do homem!

Sobre o pensamento...

Se é que existe outro lugar onde o homem é realmente livre
eu não conheço.
Talvez em um picadeiro anarquista em um palco esquizofrênico,
mas não.
Não acredito mesmo que a real noção de liberdade transcenda ao pensamento.

Basta que nós, domados por nós mesmos, libertemo-nos
Basta que nos afastemos de toda a prisão domiciliar existente
afastemo-nos das redes e conexões,
do emaranhado de sinapses,
Afastemo-nos  da mecanização do homem.

Para obter, enfim
A liberdade.

Temos instantes de escrita, voz,
temos instantes de humanização na humanidade
onde nossa presença se faz realmente presente.

E nesse breve momento
Estamos amarrados.

Correntes de âncora nos prendem ao pé da cama
Incessantemente tentamos cerrar elo por elo
da imensidão estrutural ao invés de apenas cerrar o pé da cama
madeira envelhecida, quebradiça,
imperceptível.

A impossibilidade se faz e a liberdade foge de nosso ser
antes mesmo de chegar à boca.

Foge e corre como uma criança que não conhece as maldades do mundo
mas que não aceita doce de estranhos.
Foge rapidamente para onde ela possa se fazer presente novamente.

Vai para o pensamento de muitos outros,
Amantes calados
poetas
para o pensamento dos solitários.

Foge para o pensamento daqueles que aproveitam o pensamento

E escorre em uma fluidez muito pouco tensionada
Escorre para outros enquanto o homem se faz máquina

E nesse momento incessante
Maquinarização, amarra
Humanização, amante
Um som de ferrovia invade a alma
e nos lembra, novamente
de nossa sofreguidão,
De nossa ânsia por liberdade

Fluida
que escorre por palavras,
 armadilhas sociais
silábicas e sedentas e saturadas.

Armadilhas instauradas
Um prego para cada braço e um para os pés
E a contemporaneidade repete de forma sutil o ritual

É o preço por tentar a liberdade em um mundo
onde os pensamentos se transformam em palavras
e as palavras se transformam em um mundo

É o preço de tentar a liberdade em uma palavra
onde o mundo se transforma em palavras
e as palavras se transformam em pensamentos

Espero apenas o dia em que o silêncio marcará a liberdade

Enquanto isso seguimos

Em bares, em noites de escrita
em bons sorrisos, e choros marcantes.
dia após dia
com a consciência de nossas amarras, a invisibilidade do pé da cama
Sempre transformando
homem em máquina, máquina em homem
E com medo do porvir.